(...) O filme Stuart é uma experiência quase musical ou, como sugere o seu autor, “coreográfica”. A imagem a preto e branco intensifica as possibilidades de modulação do espaço em signos, “como uma escrita corrida ou uma caligrafia em movimento”. As personagens criadas no papel por Stuart de Carvalhais aparecem no filme por vezes em continuidade, por vezes em ruptura com o fundo da tela. A substância comum ao polícia, às telhas ou aos fugitivos altera-se rapidamente à nossa frente: o que é agora um vidro quebrado, ou uma telha opaca saltando como uma tecla à passagem de Quim e Manecas, era ainda há pouco o céu onde flutuava um balão lunar. Alguém bebe, no momento seguinte a rua e a casa estarão bêbadas. Dificilmente a imagem real consegue uma transição tão justa de um ponto de vista exterior - os homens e as suas mãos, a garrafa e os copos - para a visão do próprio homem, ou até das suas mãos, destas pedras e deste chão ondulante, absurdamente próximos . O corpo balança, o chão balança, entre este dois balanceares, por vezes harmónicos, por vezes desarmónicos, somos projectados para onde não esperávamos: aí está a lâmpada do tecto vista de cima (seria possível um olhar mais próximo da embriaguez?). (...)
Luís Henriques
revista Intervalo 3, Maio de 2007
in catálogo "cinematografia – coreografia 2"
Lisboa, Outubro de 2008