sábado, 1 de novembro de 2008

LE HORLA de Jean-Daniel Pollet - 06.11.2008


Poucas obras cinematográficas se colocam, como a de Pollet, sob o signo da dança, seja ela aparente ou latente, aposta narrativa (o tango em L'Acrobate) ou princípio estético (a coreografia do mundo em Dieu sait quoi). Le Horla pertence à segunda categoria: não há dança em acto, mas uma força coreográfica que conduz soberanamente o discurso e a realização.
O cinema de Pollet é essencialmente coreográfico no facto de colocar a si mesmo como horizonte um pôr em ordem o mundo, a imposição de uma forma ao caos e à desordem primevos. Além disso, em cada um dos seus filmes, a dança é inseparável de dois outros motivos obsessivos: o círculo e a repetição. Motivos ambíguos: o círculo e a repetição são também os signos do encerramento e da libertação. Círculos do prisioneiro que anda às voltas entre as paredes da sua célula (L'Ordre), repetição divina de uma forma perfeita, movimento infinito da beleza, alegria celeste do moldar de uma obra à imagem da grande relojoaria do universo (Méditerranée, Dieu sait quoi). 
(...)
No horizonte da obra de Poullet, como da de Francis Ponge, desponta a utopia de um homem reinventado, regressado às fontes. Um homem que, como diz o poeta em Dieu sait quoi, terá reaprendido a dançar.
Cyril Neyrat
in catálogo "cinematografia – coreografia 2"
Lisboa, Outubro de 2008