(...) É necessário fazer aqui uma sinopse do filme. É impossível fazê-la. Porque poderíamos dizer: é um filme sobre um realizador de documentários, Jim Dunn, que paga a droga a um grupo de jazz de New York para que o grupo se deixe filmar. E se disséssemos, em vez disso, que se trata de um filme sobre um grupo de jazz que, pelo contrário, se deixaria “vender” por sentir o abismo da câmara, a tentação de se tornar espectáculo? Trata-se de voyeurismo do realizador e do cameraman, que penetram numa realidade estranha, ou de exposição desesperada de um grupo de músicos drogados capazes de subjugar, sugar o olhar alheio? Enfim, como resumir este filme sem estabelecer imediatamente um eixo, uma preferência focal – quando o mesmo filme desmonta as ideias de documentário, teatro, realização, quando nunca se pode dizer com certeza se o realizador controla ou é controlado pelos músicos, quando filmar e participar se fundem? (...)
Pedro Eiras
A Utopia do Real
O Olhar de Ulisses III
2001-Porto
in catálogo Temps d'Images 2003