(...) Mas que está este elefante a fazer, esse espantoso animal, que aspira e sopra o pó na sua coreografia dissonante de tudo excepto da música que estamos a ouvir? Como em Lumière, é um filme de um só plano, um plano-filme mais do que um plano-sequência. (...) O plano, esse bloco inextricável de espaço tempo dura 4’10’’, a duração exacta do Tango de Igor Stravinsky. (...) E é exactamente aí que ocorre aquilo a que temos de chamar o puro milagre do cinema: é como se o elefante ouvisse, interiormente, o Tango de Stravinsky e lhe respondesse com movimentos muito suaves, quick, quick, slow, (...) num acordo profundo com o ritmo, os seus progressos e repetições, as cordas e os sopros, os pizzicati, toda a evanescente massa orquestral que o acorrenta e que parece emanar dele. Mas que estará ele, então, a ouvir? (...)
Jean-André Fieschi
in catálogo "cinematografia –coreografia"
Lisboa Novembro de 2007