(...) Não basta olhar de caras – “objectivamente” – uma coisa para apreender a sua verdade: ilusão da ciência que, pelo contrário, há que combater. É preciso fazer obra de arte, ou seja, em cinema, encontrar a imagem (visual ou sonora) que, sem perturbar a coisa, permita que a sua presença se manifeste. Encontrar a boa distância, o movimento correcto, a duração adequada: restituir na imagem a beleza da coisa. Fazer com que a imagem retorne, insistir. Levar a imagem e a coisa à maior intimidade para que a imagem não tenha outra beleza que não seja a que emana da coisa.
Ponge chamava a arte literária “em socorro do homem que já não sabe dançar, que já não conhece o segredo dos gestos e que já não tem a coragem nem a ciência da expressão directa pelos movimentos”. Pollet ensina de novo cada um de nós, espectadores de Dieu sait quoi e da sua coreografia recolhida e sensual, a dançar.(...)
Cyril Neyrat
O Olhar de Ulisses IV - Porto 2001
Resistência
in catálogo Temps d'Images 2003