sexta-feira, 29 de outubro de 2010

ONCLE VANIA de Pierre Léon - 04.11.2010 - 19h30 - Ante-estreia

(...) A melancolia [...] é difusa, é daquelas que nos assalta depois de um almoço de Verão, quando se resiste à sesta para conversar devagarinho com os familiares ou sentar-se preguiçosamente debaixo de uma árvore, porque o álcool e o cansaço da digestão deixaram os olhos demasiado sensíveis. Então, a preguiça de um instante deixa-se atravessar pela nostalgia de aventuras mortas, enquanto um vago tédio torna o futuro insuperável - uma suave indolência sugere-nos que tudo acabou. O Tio Vânia é aquele que não quer deixar-se levar por este estado que, lucidamente, constata para o rejeitar: recusa a beatitude de Gaufrette (Vladimir Léon) e, quando Elena Andreïevna (Bénédicte Dussère) declara que está um tempo maravilhoso, ele responde alegremente que “está um tempo para a gente se enforcar”. Ora, talvez seja precisamente por estar maravilhoso que é de “se enforcar”: tal como, por vezes, um bem-estar passageiro nos lembra que a felicidade é impossível, aquilo que surge como maravilhoso pode levar-nos a pensar naquilo que já não o é. Pierre Léon torna estes sentimentos palpáveis através da luz, mas, também, através da presença dos actores que parecem ter sido enredados no estado das suas personagens, como que envolvidos num doce cansaço.(...)
Marcos Uzal
in catálogo "cinematografia – teatralidade 2"
Lisboa, Outubro de 2010

sessão com a presença de Pierre Léon, Diogo Dória, Marcos Uzal