terça-feira, 4 de dezembro de 2007

ANTÓNIO, UM RAPAZ DE LISBOA de Jorge Silva Melo - 14.12.2007


(...) Que faz ele (Jorge Silva Melo)? Traduz o sentimento de instabilidade universal do mundo. Nós somos acção, somos movimento. Neste filme onde tanto se fala de touradas e toureiros pega a realidade pelos cornos, corre o risco maior de propor outros caminhos para o cinema português. E depois regista ainda, sem insistir, o trabalho da morte. Porque a exuberância matisseana do conjunto, a lembrar – a mim lembra-me sempre – os musicais da MGM e em particular Um dia em Nova York (On the town) e o admirável número de dança de Donald O’ Connor no estúdio de Serenata à Chuva, oculta mal a “ambição da catástrofe” de que fala algures Henry James e que vem regularmente à superfície em tantos momentos da obra teatral e cinematográfica de JSM.  (...)  
António, um rapaz de Lisboa /o filme, assenta em contínuas e cruzadas variações de velocidade do andamento das suas múltiplas personagens - trata-se de um retrato de grupo de jovens adultos à deriva - , das suas correrias à procura de qualquer coisa que as acalme: a droga, por exemplo. Não disse andamento por acaso. Aqui visa-se alto. É em termos de escalas e ritmos, em orquestração que deve falar-se. JSM escolheu medir-se com a música e com a coreografia. No furacão que atravessa o filme, feito do movimento dos actores quase correndo na cidade, ora achatados contra as paredes das ruas, ora descobrindo bruscamente à sua volta a imensa profundidade de um cruzamento ou praça e nessa magnífica abertura inscrevendo novos andamentos e rimas cromáticas, a um vermelho que alguém traz em grande plano vão responder no espaço perspectivo, a diferentes distâncias, outros vermelhos, tudo isto feito com uma segurança e uma ambição muito raras no cinema português.
            Alberto Seixas Santos
            Lisboa,  Novembro  2007